segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

O preconceito não traz felicidade para ninguém, nem para quem sofre o preconceito nem para quem é preconceituoso.

GORDAS NÃO MERECEM DANÇAR

Mas merecem cair. Sem se levantar.

David Duchovny, na sua série de TV (que nunca vi) Californication, ouve seu pai aconselhar: “Life's too short to dance with fat chicks” (a vida é curta demais para dançar com garotas gordas). Lógico que o dançar pode muito bem rimar com outros verbos que envolvem atividade física, como conversar e transar. Enfim, a mensagem é clara: não perca tempo interagindo com gordas. Esse slogan está à venda nos EUA e pode ser adquirido em adesivos e camisetas porque, né, é muito mais cool e descolado passar mensagens de intolerância que de paz e amor. Bem, adorei o que uma moça gorda escreveu num post, convidando o David Duchovny pra dançar com ela. Ah sim, ela é dançarina profissional, como pode ser visto pelos vídeos. Será que a vida é curta demais pra dançar com ela?
Mas claro que, aqui no Brasil, a gorda do momento é Paula, do BBB11. Eu não vi nem verei BBB11, porque essas coisas viciam, e tenho que aproveitar melhor meu tempo. Mas li que rapidamente Paula foi apelidada de Jabulani. Paula está longe de ser uma bola. Ela sequer é obesa, imagino, se formos levar em conta seu IMC. Mas fugiu um milímetro dos padrões? É uma balofa, uma baleia, um elefante, um “pedaço de m****” (como vi num blog), uma visão do inferno. E isso que Paula está dentro de vários outros padrões – é branca, loira de cabelo liso, olhos claros, jovem. Mas se estiver um pouco acima do peso, é motivo para ser bullied por toda uma nação. Desconfio que seja de propósito: que a Globo ponha no BBB alguns participantes pra virarem alvos de uma catarse coletiva de bullies. Na falta de um Marcelo Dourado (foi só a primeira semana; quem sabe já já alguém dentro da casa assume o papel de preconceituoso oficial?), cabe a todos os espectadores tirarem sarro, juntos, de uma gorda. Há também uma transsexual, que também, óbvio, recebe sua imensa cota de insultos. Mas, até agora, pelo que vi, nada que se compare a Paula. Detestar gordas é um esporte nacional.
Anteontem houve algum tipo de prova, algo idiota como ter que se agarrar a uma garrafa gigante do anunciante que pagou mais. Paula caiu diversas vezes, e o pessoal do outro lado da telinha morreu de rir. Sério, teve gente que disse que foi a coisa mais engraçada que já viu na vida – uma gorda caindo! E se Paula tivesse se machucado, seria mais ou menos engraçado? Pelo que li, houve uma outra participante, essa com o corpo em forma, que também caiu uma pá de vezes. Mas dela ninguém falou. Afinal, a graça tá numa gorda caindo.
É sério que chegamos a esse ponto? Viramos uma enorme escola, em que todos se reúnem pra insultar a gordinha da segunda série? Quando a gente vê isso numa escola, acha bonito, incentiva? Não é de hoje que gorda transformou-se no pior insulto que uma mulher pode receber. Porque é um código. Falou em “gorda” e vem tudo junto: não precisa nem dizer que é feia (como gorda pode ser bonita?), que tá com um pé na cova, que é burra (se fosse inteligente seguiria o padrão de beleza), e que morrerá sozinha. A gorda é aquela menina que nunca é tirada pra dançar, num mundo em que ainda são os meninos que tiram as meninas pra dançar. E eles não devem perder minutos preciosos de sua existência dançando com uma gorda.
A vida é muito curta mesmo. Mas parece que nunca é curta demais para as pessoas gastarem seu tempo com todo tipo de preconceito. 

No  http://escrevalolaescreva.blogspot.com/

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