domingo, 3 de junho de 2012

Sim, somos vadias!

Nosso papel, como homens, não é o de guiá-las à iluminação, mas a de estar ao lado delas em suas lutas e deixá-las se comportar como bem entenderem. Temos de entender que não as comandamos, mas somos parceiros, iguais. E enquanto elas forem tratadas como inferiores, devemos sempre estar prontos a ir à luta, junto com elas.

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Vadias, putas: E a liberdade da mulher?

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Foto: Cláudio MacielNão é fácil ser mulher. Na verdade, nunca foi fácil. E não é preciso ser uma — eu não sou — para saber disso, basta conhecer um pouco de história e, enfim, observar o mundo. Um homem sem camisa está apenas com calor, uma mulher sem camisa, se em público, é uma vadia. De objeto de desejo (notem bem o “objeto”) à puta em um pulo, a depender do contexto ou do interlocutor, mas jamais algo natural.
Elas já foram bruxas, já foram incapazes de votar, de andar sozinhas (na Arábia Saudita ainda são pouco melhores que cães, e isto porque quero ver encontrar um cão por lá, os Árabes não são seus maiores fãs), de pensar... Meros objetos (de novo) para o prazer masculino.
Prazer mesmo elas não sentem.  Os dez segundos até o garanhão chegar ao gozo, se não forem suficientes para a mulher, azar o dela. E nem pensar em se masturbar para compensar, é pecado. Mulher que pensa é um perigo, a que cura é bruxa, a que enfrenta a adversidade e luta para ser alguma coisa é... inaceitável!
As mulheres nunca foram relevantes na história, salvo exceções. Não por não serem capazes, pelo contrário, mas por serem impedidas de viver livremente e, quando o faziam, a história buscava apagá-las.
O pior de tudo isto é que não falo de um passado distante, mas do século 21, de hoje. E não apenas da Arábia saudita e semelhantes, mas em grande parte do Brasil.
Com o crescimento do fanatismo e alcance de igrejas (neo)pentecostais, o silêncio governamental, o aumento do conservadorismo da população vemos episódios de brutal violência contra a mulher e contra sua liberdade — sem contar com o aumento assustador da homofobia, que também vitima mulheres, mas isto é assunto para outro artigo.
Casos como os de Geisy Arruda são emblemáticos. Após sofrer violência e humilhação, acabou se tornando o objeto que era repudiado na Uniban, mas parece ser admirado em rede nacional de TV. Não é possível culpá-la. Nem por se vestir com vestido curto — é problema seu — nem por ter sucumbido a um estereótipo — assim dita a sociedade. É melhor lucrar com a adversidade que simplesmente sumir na depressão, não é?
Aliás, não cabe a mim, um homem, culpar uma mulher por seu comportamento. E sim, estou dizendo que o problema é dela, e só dela, se comportar como bem quiser.
Além disto, estamos falando de um país — ou de uma sociedade — absolutamente midiática. É preciso ter 15 minutos de fama, aparecer na TV para ser “alguém”, logo, não surpreende o rumo dos acontecimentos.
Na nossa sociedade, a mulher pode tirar a roupa em um humorístico de qualidade duvidosa, mas jamais andar com roupas curtas na rua, faculdade... Ela provavelmente cairá na boca do povo de qualquer forma, mas parece melhor ser um objeto de desejo que ser violentada.
E sim, estas são as “opções” mais comuns para quem foge do padrão conservador — esquizofrênico tupiniquim.
É interessante que uma sociedade tão sexualizada, ou melhor, onde a mulher é sempre mostrada como objeto de prazer, onde há um carnaval em que é comum vermos mulheres seminuas ainda se escandalize com uma mulher que tenha transado com mais de uma pessoa, que não case virgem... Na verdade, não é interessante, faz sentido. Voltamos a falar de “objeto”.
Vale lembrar, para um homem, “pegar” cinco garotas numa festa é algo maravilhoso, ele é apontado como “garanhão” pelo grupo. Se o mesmo “feito” vier de uma mulher, ela logo será taxada de puta. Mas, na prática, qual a diferença? Porque uns podem, outro(A)s não? Não que este comportamento desregrado seja o ideal, mas devemos ser livres para decidir.
Mulheres ainda recebem menos que os homens e nosso governo não teve a coragem de manter uma proposta igualando os salários por força de lei. E isto porque temos uma presidente mulher, uma presidentA, mas que até agora não deu um passo sequer no caminho dos direitos das mulheres. Pelo contrário, aprovou medida provisória que torna ainda mais complicado o aborto, ao tentar dar direitos a um feto, como se fosse um ser humano, dentre outras medidas.
Enfim, em pleno século 21 mulheres, milhares, são forçadas a sair às ruas e se manifestar pelo simples direito de serem livres. De terem direitos sobre seus corpos, de se vestirem como quiser e de poder decidir suas vidas sem a imposição de um homem, de uma sociedade machista.
A marcha das vadias que aconteceu nos dias 26 e 27 de maio é uma demonstração da crescente insatisfação das mulheres com o tratamento que recebem. Devem seguir um padrão único de beleza, se vestir sempre da forma “correta” para cada momento, ou seja, devem se vestir para serem desejadas quando o homem quiser, quando a mídia ditar, e devem se esconder se fogem do padrão ou em momentos específicos.
Não podem decidir sobre suas vidas, sobre como se vestir, sobre como e quem amar.
Engana-se o homem que pensa não ter responsabilidade. Somos todos machistas, em graus diferentes, uns pouco, outros muito, mas todos temos algo de machista em nós, nos pequenos detalhes, nas menores atitudes — ou mesmo em todas elas.
Nossa função, pois, é a de ouvir, compreender e apoiar as mulheres em sua luta, ao passo que tentamos aprender como agir e como respeitá-las.
Nosso papel, como homens, não é o de guiá-las à iluminação, mas a de estar ao lado delas em suas lutas e deixá-las se comportar como bem entenderem. Temos de entender que não as comandamos, mas somos parceiros, iguais. E enquanto elas forem tratadas como inferiores, devemos sempre estar prontos a ir à luta, junto com elas.

No http://www.revistabula.com/posts/colunistas/vadias-putas-e-a-liberdade-da-mulher

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